Cultura, espiritualidade e resiliência
“Cultura, espiritualidade e resiliência”
Particularidades do caso dos Meninos Presos na Caverna.
Após 19 dias de apreensão e horas de delicada operação de resgate, os 12 adolescentes e o treinador do time de futebol amador “Javalis Selvagens”, foram resgatados da caverna de Tham Luang, e encaminhados ao hospital. O mundo respirou aliviado, e apesar da morte do ex-mergulhador da marinha tailandesa, durante as ações pré-resgate, o desfecho da crise que começou em 23 de junho chegou a um desfecho feliz.
O grupo resgatado, assim como os seus familiares e amigos próximos, afetados por momentos de enorme pressão emocional, receberão suporte em Saúde Mental. Os protocolos que serão oferecidos terão entre os objetivos, a prevenção do desenvolvimento de transtornos e adoecimento psíquico, e deverão ter os fatores humanos integrados ao acompanhamento oferecido, com atenção permanente às manifestações de subjetividade de cada pessoa afetada. E isso porque vivências disruptivas exigem reflexão sobre o modo como o ambiente irrompe no psiquismo humano, e devem ser analisadas em termos das reações pessoais dos danificados e do seu impacto psicológico.
Na história dos “meninos presos na caverna”, há particularidades que merecem atenção. E não apenas por conta do desfecho exitoso, com a existência de situações inesperadas, como por exemplo, a falha nas bombas de sucção nas horas finais da operação. A presença do treinador espiritualizado e na função de “cuidador”, oferecendo suporte emocional durante os dias em que o grupo esteve incomunicável e sem recursos, representa um diferencial para a sobrevivência dos meninos. E também a Cultura Tailandesa, revelada em ações de amparo simultâneo às pessoas afetadas, direta e indiretamente, pela “quase tragédia”, são dois elementos positivos em favor do resultado alcançado.
Independente da religião professada, em situações de crise e desastres, as pessoas espiritualizadas e que desenvolveram a capacidade de refletir sobre as adversidades, buscam respaldo no conhecimento para enfrentar a situação concreta e disruptiva. Essas pessoas tendem a usar essa habilidade como ferramenta emocional que as auxiliará na tomada de decisões. E nesse contexto o destino parece ter selecionado bem o treinador assistente Ekkapol “Ake” Chantawong, de 25 anos. Antes de se dedicar ao esporte, Ake foi monge budista por uma década. E na situação vivenciada pelo grupo, os princípios filosóficos ligados à compreensão e superação do sofrimento (As Quatro Nobres Verdades da doutrina do Budismo), praticados por ele, foram elementos importantes para que o grupo se mantivesse unido, motivado e, na medida do possível, calmo, diante da adversidade. Ake conseguiu que o grupo vivesse as experiências emocionais como formas de enfretamento e não de desistência da vida. E foi ele quem estimulou a capacidade de resiliência do grupo, na violenta experiência que viveram.
Em muitos momentos dessa história, a cultura tailandesa (antiga e influenciada por inúmeros povos orientais), pode contribuir para a solução da crise. A solidariedade, a capacidade de aceitar auxílio sem tender à vitimização, e a percepção do bem social como um valor superior aos desejos individuais, foram notáveis dentro e também fora da caverna. Nas ações da equipe de gestão de crise, por exemplo: houve atenção às famílias afetadas, quando os nomes dos primeiros jovens resgatados não foram revelados, até que todos estivessem fora de perigo. Assim como a cuidadosa restrição à imprensa, na saída da caverna, ajudou a desestimular exposições exageradas e potencialmente nocivas aos afetados pelo evento.
Por fim, a noção de pertencimento que é ensinada às crianças tailandesas, e a concepção de sucesso como objetivo a ser alcançado em grupo, foram aliadas dos garotos. Sabedoria que permitiu que se mantivessem focados para superar a adversidade, e ainda serão elementos importantes, como facilitadoras do trabalho de suporte em Saúde Mental, a ser empreendido.
Prof. Dr. José Toufic Thomé.